domingo, 21 de dezembro de 2008

A melhor redação que escrevi na vida

Chico Buarque lançou seu primeiro livro, Estorvo, no início dos anos 90. E foi no início dos anos 90 que recebi os maiores incentivos para escrever. A maior entusiasta da minha carreira como escritora mirim foi a professora Dora.

Me lembro que como ela ficou inconsolável quando decidi sair da escola na 8ª série para entrar no curso técnico de Automação da Manufatura. "Você não vai escrever mais nenhuma redaçãozinha?" foi a única frase que ela conseguiu dizer. E tinha toda a razão.

A Dora pediu uma vez pra gente escrever uma descrição de um professor. Alguns dias antes, eu tinha usado um adjunto adverbial muito bem colocado (certamente por influência da "Tabacaria", de Fernando Pessoa) num outro texto. Recebi um mega elogio dela! Com a solicitação da descrição de um professor, identifiquei imediatamente a grande chance e pus minhas mãos à obra.

O texto que escrevi utilizava basicamente adjuntos adverbiais e adjetivos, todos em relação de oposição entre si. Terminava com "matematicamente metafórico, simplesmente complexo, comprovadamente humano". Reli o texto com a certeza de que aquela tarde procurando sinônimos e antônimos no dicionário tinha valido a pena. O texto tinha estilo, ritmo, força. Eu me sentia a própria herdeira do legado de Chico Buarque, para dizer o mínimo.

Alguns dias depois a Dora me chamou pra conversar e perguntou como foi o processo de escrita da redação. Contei toda a empreitada, ela agradeceu a explicação e, alguns dias depois, chegou a minha nota. Eu tinha tirado B.

Li muitas vezes a justificativa que acompanhava o B até conseguir entender o que tinha acontecido. Ela dizia que o objetivo não era que nós fizéssemos um texto construído, artificial. Como se os grandes escritores não trabalhassem muito em seus textos antes de serem publicados! Vai entender...

O mais legal de tudo foi que isso não abalou em nada minha confiança no meu texto, como seria de se esperar de mim. Apenas entendi naquele momento que critérios são critérios e que gosto não se discute. Segui feliz com a minha vida (e com meu texto).

Convicção é algo que realmente devemos praticar em tudo o que fizermos. Vive-se muito melhor quando se conta com ela.

2 comentários:

Anônimo disse...

Obrigada pelo toque, flor! Acho que agora reverti a coisa! Dá uma olhada! Beijossss.

Anônimo disse...

Flor, esta Dora é a Saggese? Vc lembra do sobrenome dela?? Beijos.