quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Sobreviventes

Nos anos 80, como em todas as décadas desde que o mundo é mundo, crianças não foram programadas para sobreviver. E nós não fomos diferentes.

Me lembro do dia em que meu irmão, ainda bebê, caiu de seu carrinho com a cara em cima de um cano desencapado. Foi assim que ele conquistou uma bonita cicatriz em formato de anzol que o acompanha até hoje.

É viva também a memória do sangue correndo da minha cabeça e manchando minha blusa favorita (uma miniblusa azul, da Minnie) na ocasião uma série de fatos imprevisíveis me renderam alguns pontos no alto da cabeça. Quem poderia imaginar que rolar de costas por sobre um grande tambor solto perto de um tanque de areia - este deliminado por pequenos muros de cimento - poderia resultar em qualquer tipo de acidente?

Um acidente potencial que nunca ocorreu - apesar das frequentes chances que demos - foi cairmos de uma escada que existe na casa da minha mãe direto na outra parte da escada - de uma altura que vaia de 1 a 4 metros. Era a coisa mais gostosa do mundo abraçar o murinho que servia como corrimão e ir deslizando lá de cima sem colocar os pés nos degrais!

À medida que vamos crescendo, ficamos mais previdentes, nos afastamos das situações que podem nos machucar. Talvez por irmos aos poucos construindo um repertório maior de experiências de dor (creio que isso vale também para outras dores menos tangíveis que conhecemos mais tarde na vida).

Quanto mais nos protegemos - o que equivale de uma certa forma a cultivarmos o medo - mais distantes ficamos também da deliciosa sensação de alegria que os momentos anteriores Em às possíveis fatalidades nos trazem.

Nos machucamos menos, mas nos fazemos menos felizes também. Trade offs. Faz parte do processo de deixarmos de ser crianças. Reflexo, talvez, de acreditarmos que temos mais o que perder depois de adultos.

Ou não?

Um comentário:

Kris Arruda disse...

Discordo, crianças foram justamente programadas para sobreviver. Não tinham pq....mas sobrevivem...

Tô gostando do ritmo de publicação dos textos...muito bem...